23|1981|10.02

28.11.03

Ainda

Eu ainda penso em você. E o pior é que eu gosto de pensar em você.
Acho que às vezes eu não sei gostar de mim.
Me troco por você. E saio perdendo.
Coisas estão mudando. Entendi que algo só vai acontecer quando todo o universo tiver conspirado e estiver alinhado de forma que aquele acontecimento seja inevitável. Pois é, tanta dor e sofrimento não me fizeram apenas mais forte, mas sim, mais paciente.

24.11.03

ENFERMARIA MILAGRES

O PAI SE RECUPERA DA CIRURGIA NO CORAÇÃO
O IRMÃO SE RECUPERA DO ACIDENTE DE CARRO.
A IRMÃ SE RECUPERA DA LIPOASPIRAÇÃO
A MÃE SE RECUPERA DA PLÁSTICA NOS OLHOS.
EM MENOS DE UM MÊS MINHA CASA VIROU UMA ENFERMARIA.
E VC AINDA ACHA QUE ESTOU DESEMPREGADA?????
Sou filha-homem, motorista, mirim, dog-walker, acompanhante, enfermeira, cozinheira, e nas horas vagas, namoradeira.

O paraíso
O paraíso tem vários nomes. Um deles por ser Comandatuba.
O paraíso é uma ilha azul e verde. O azul do mar, do céu e das piscinas; o verde de 25.000 coqueiros.
O paraíso tem anjos uniformizados trabalhando para o seu conforto e bem estar. Anjos que nos sorriem desejando 'bom dia', anjos que como mágica seguem nossos passos limpando e organizando tudo o que deixamos para trás, e quando vc volta para lá, está tudo perfeito como antes.
O paraíso tem uns camarões grandes, bixo, tem até indigestão, mas a indisgestão no paraíso, eu te garanto, é melhor do que em qualquer outro lugar do mundo.
O paraíso tem hidromassagem, mesa de sinuca e tinha até a Nalu!
Sem contar o sol, ah eu nem preciso contar a cor de paraíso que eu voltei de lá.
O paraíso tem também um moreno. Dos olhos verde-caramelados, apertados e brilhantes. Tem um sorriso envolvente, assim malicioso até. Um sorriso de beijo gostoso. Um corpo charmoso, assim gostoso.
O paraíso tem camas olhando para um céu de 1.000 estrelas brilhantes e uma lua plena.
É, o paraíso mora longe...mas um de seus exemplares não!

PACIENTE

Era uma tarde quente e ensolarada de sexta-feira quando recebi a notícia. Eu olhava a piscina da janela do quarto dele, a água estava chamativa e azul, o sol estava ardente.
Meu pai entrou no quarto dele com o telefone encostado no peito e me deu a notícia.
- Pai, manda o meu irmão para um terreiro de macumba logo de uma vez, esse garoto deve estar com encosto, bateu o carro DE NOVO !! Puta que pariu, machucou?
- Ele já esta subindo pro centro cirúrgico.
- Centro cirúrgico?!? Onde?? Em Bauru mesmo??? Ai meu deusoputaquepariu o que foi que ele aprontou dessa vez?
Meu pai ainda está se recuperando das 5 pontes de safenas que precisou fazer para salvar o seu coração. Minha mãe estava viajando e minha irmã trabalhando.
OK, Marcelle, agora é com você. Vai, não pense muito, vá para Bauru, encontro o teu irmão, resolva as questões de seguro, converse com os policiais, averigúe e apure os fatos.
Certo, comecei pela estrada, muita calma, cheguei ao hospital.
Meu pai, que me acompanhava chorava, isso me cortava o peito. Tinha medo do coração dele não agüentar. Era o 4º acidente de carro em 2 anos. Esse já era o 4º carro que ele ganhava e destruía. Meu pobre pai se sentia um lixo, desvalorizado pela imprudência egoísta e juvenil do seu tão querido filho caçula.
Foi fácil encontrar meu irmão, meu pai sendo médico, tinha livre acesso aos setores e corredores do hospital. Vi uma múmia enfaixada, cheia de sangue na cara, corpo coberto. “Uhm... esse braço eu conheço, esse pescoço também
- Gilson!
- Oi...
- Meu irmão o que foi que você fez dessa vez?
- Não foi culpa minha.
- Sei, mas não precisa mentir pra mim, eu não conto pro pai, vai.
- É sério, Má, o cara cortou a minha frente.
- O seu rosto o que aconteceu com ele?
- Tem uma buceta na minha cara, abriu a minha testa, meu olho, to cheio de vidro, tive que segurar a minha testa pra ela não cair.
Eu não sabia se ria do sangue-frio dele ou se chorava por ver tanto sangue nele.
Eu nunca o vi chorando sem ser por motivo de morte. Ele chorou um pouco.
Eu tinha vontade de pegar meu irmão no colo, de abraçá-lo, mas me contive e segurei a mão dele até que a cirurgia plástica foi iniciada.
Fui ver o carro. Havia muito sangue. Era a 4º vez que ele destruía um carro, em 2 anos.
A única vez em que ele não estava errado, havia muito sangue.
Eu senti medo de perdê-lo. Passei a noite no hospital com ele e com o monte de amigos que foi lá visitá-lo. Fizemos praticamente uma festa no quarto, o banheiro era o fumódromo. Dormimos uma noite perto um do outro, como há muito tempo não acontecia, tivemos um certo diálogo, enfim, baixamos nossas armas.
Ele temia a cicatriz e seu rosto.
- Má, como é a minha cicatriz?
- É grande (e fui desenhando meu rosto com o dedo enquanto descrevia), desce pela testa, passando pela sobrancelha, passa pelo olho esquerdo, por cima do nariz e vai até a metado do olho direito... e tem também mais uns outros pontinhos....
- Não pode ser tudo isso!
- Mas é. Olha, vai por mim, vc vai ficar com uma marquinha tão sexy na sobrancelha, que as mulheres não vão resistir. Não liga não.
- Será?
No dia seguinte ele teve alta, já estava bom, bom até demais. Mal saiu do hospital, correu para sua trincheira e começou a disparar contra mim. Eu sentia muita raiva dele, não contive as lágrimas, o que foi motivo de mais disparos vindos dele com o apoio do meu pai, que estava penalizado pelo que tinha acontecido ao seu pobre filhinho.
Cheguei em casa, deixei os dois exemplares machistas em casa e me refugiei na casa da minha irmã.
A guerra havia recomeçado. Eu, tentando conquistar a amizade dele, continuo a me ferir e contra-atacar a cada crítica, cada xingamento; Ele, com pose de dono da verdade, machista e egoísta, só tem críticas e maledicências a meu respeito.
Somos normais. Eu tentei a paz, ele não quis, que recomece a ‘Guerra fria’. Não moramos juntos mesmo, espero que um dia ele entenda... somos irmãos.